quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Ilíada - O meu clássico

                  

Imagem da NET: desconheço autoria

(Relatório apresentado como primeira avaliação da Disciplina 'Fundamentos da Literatura Ocidental'- UFRN-2010 ministrada pelo professor Dr. Antônio Fernandes de Medeiros Júnior)

Preâmbulo

Foi recentemente lendo um texto de Italo Calvino que compreendi melhor minhas inquietações de adolescente quanto à dificuldade de ler e compreender um grande livro. Em Por que ler os clássicos, o autor traz algumas propostas de definição de Clássicos e numa delas aborda a leitura de uma grande obra na juventude, quando geralmente feita de forma apressada, com a impaciência e as inexperiências próprias da idade, mas que, mesmo não sendo tão proveitosa, deixa marcas importantes que servirão de paradigmas, de comparações para as experiências futuras, modelos estes que permanecerão conosco, ainda que lembremos pouco ou quase nada daquele livro.

Já a leitura pela primeira vez de uma grande obra na idade madura é uma experiência inigualável. A maturidade proporciona as condições adequadas para a apreciação da leitura com uma visão mais crítica, sendo os detalhes e significados infinitamente melhor percebidos. Considerando a ideia de Calvino,
Dizem-se clássicos aqueles livros que constituem uma riqueza para quem os tenha lido e amado;   mas uma riqueza não menor para quem se reserva a sorte de lê-los pela primeira vez nas melhores condições para apreciá-los.
Quando tentei ler a Ilíada pela primeira vez eu devia ter aproximadamente uns 14 ou 15 anos. Recordo nitidamente a impressão que a obra me causou, e posso afirmar que o fato de não compreendê-la gerou uma reação imediata de antipatia e assim desisti nas primeiras páginas. Ao longo dos anos, mesmo sabendo tratar-se de uma leitura importante, eu a folheava, lia alguns trechos mas não conseguia lê-la por completo.

Essa antipatia, entretanto, não foi suficiente para que eu a relegasse ao esquecimento. Deparei-me com a obra em várias outras ocasiões, quando então a olhava, brigava um pouco com ela e a deixava em paz. O fato é que entre brigas e tréguas, nunca a perdi de vista. Eu sabia que ainda íamos nos enfrentar, pois já adivinhara que a minha antipatia pela obra, o meu desejo de deixá-la de lado, não eram mais fortes do que a vontade de lê-la, e em seguida colocá-la no topo da lista dos meus clássicos. Então parece que Calvino formulou o seu conceito  baseado em impressões comuns a muitos leitores e a  aspirantes a leitores como eu:
O seu clássico é aquele que não pode ser-lhe indiferente e que serve para definir a você próprio em relação e talvez em contraste com ele.
E foi assim que enfim pude encarar Homero de frente, ainda que de forma um pouco prejudicada pela leitura imposta como atividade acadêmica. Deveríamos ler a Ilíada  com o fim de preparar um SEMINÁRIO para apresentar ao professor de Fundamentos da Literatura Ocidental da UFRN, Antônio Fernandes de Medeiros Júnior e aos meus 60 colegas de sala.

Não foi fácil. Foram dois meses de sofrimento e aflição. Quase um parto, ter que extrair a essência de uma obra tão complexa, depois de tantos anos sem estudar. 
Considerando minhas limitações, creio que os esforços não foram em vão. Li o livro com mais prazer do que imaginara e, ao final, completamente deslumbrada, cumpri a tarefa  com a confirmação das minhas suspeitas: A Ilíada é uma obra-prima, um legado indiscutível que Homero deixou para a Humanidade e que indiscutivelmente influenciou toda a literatura que veio depois. Digna de ser lida e relida, a cada leitura proporciona uma nova descoberta, um encontro com detalhes inusitados o que me leva a eleger o meu conceito preferido de Clássico,  dentre os tantos de Calvino:
Clássico é um livro que nunca terminou de dizer aquilo que tinha para dizer.
Assim sendo, modestamente apresento a seguir, as impressões que a Ilíada me deixou. Espero poder percebê-las cada vez mais novas e significativas e poder retirar deste Clássico outras tantas novas impressões: 

RELATÓRIO

Homero e seu guia, de William-Adolphe Bouguereau (1825-1905)


A Ilíada conta os acontecimentos em torno do cerco de Troia  empreendido pelos gregos, narrando um pequeno período do décimo ano dessa guerra, e destaca principalmente a ira do herói Aquiles, presente em dois momentos distintos: no início da narrativa, quando do desentendimento com o rei de Micenas e comandante do exército Aqueu, Agamémnone, e nos momentos finais, movido pelo desejo de vingar a morte de Pátroclo, seu primo, amigo e escudeiro fiel.

Ao longo da obra, vemos que há dois planos principais:
Aquele dos homens nas naus, na praia e por trás dos muros de Ílio, dos guerreiros que se digladiam, matam e morrem movidos por seus  ideais e valores  em defesa da pátria e do seu povo.  
Manuscrito grego da Ilíada, livro VIII, linhas 245-253. (final do século V, início do século VI a.C.)
Nesse palco, está o inconsequente Páris, que não é valente nem guerreiro nato e tem consciência da própria fraqueza. Aparentemente pivô da contenda, representa a punição a Troia  Inspira a proteção de Afrodite, que o retira da pugna para devolvê-lo ileso para junto de Helena. A covardia o faz fugir da guerra e o seu regresso é motivado pela vaidade e pelo desejo de glória. Há ainda o rei espartano, Menelau, que luta para defender sua honra ultrajada pelo rapto da esposa Helena. Esse parece ser o cenário ideal para que o irmão de Menelau, Agamémnone, comandante de um exército tão poderoso, exerça toda sua arrogância e cupidez, que tantos infortúnios trazem aos Aquivos, desde a peste lançada por Apolo até a ira primeira de Aquiles, que acaba se retirando da guerra com seu exército, os Mirmídones. 



Páris e Helena, Jacques -Louis David (1748-1825)
Destaca-se o desejo deste herói e semideus de atingir a glória, perecendo precocemente, em detrimento de uma vida longa e tranquila, mas relegada ao esquecimento.  Seu projeto de vida se opõe ao de Heitor, maior dos guerreiros troianos, que luta para defender uma existência segura e próspera para seu povo e sua pátria. Diomedes, príncipe de Argos, é o modelo de guerreiro: jovem, corajoso, atrevido e cheio de ímpeto. 
Aquiles e Agamémnone – afresco Pompeiano 
Quando ninguém ousa enfrentar Heitor, ele se lança contra o guerreiro troiano e é necessário que  Zeus, que deseja o êxito dos troianos, intervenha, lançando fortes relâmpagos, e expulse os dois ferozes soldados do campo de batalha. É aqui que o guerreiro e rei de Ítaca, Odisseu, usa toda sua sagacidade e astúcia, que, aliadas às proezas de Diomedes, à sabedoria e à sensatez de Nestor,  à truculência de Ajaz Telamônio e à  agilidade de Ajaz, rei dos Lócrios, orientam os rumos da peleja que impulsionam os gregos à vitória.
Da esquerda para a direita: Menelau, Paris, Diomedes, Odisseu, Nestor, Aquiles e Agamémnon.
Porém, esse plano não é exclusivo dos guerreiros: confinados em Ílio, há Andrômaca e Hécuba, valorosas esposas e mães e outras tantas mães e esposas, que choram a morte dos seus filhos e esposos; Há pais que, à semelhança de Príamo, perdem seus filhos e guerreiros, e há filhos órfãos de futuro funesto. Há anciãos e crianças à mercê dos  gregos e fragilmente amparados pela valentia dos seus guerreiros e pela relativa segurança dos  muros de Ílio. E há Helena, que nem é mais troiana nem grega, que não é culpada pela beleza recebida dos deuses, nem controla  as consequências  desse dote e,  ainda assim seria a motivação da fatalidade que destrói Troia.

Escultura de Hera e Zeus, em frente ao Parlamento em Viena
Em outro plano, estão os deuses onipotentes, que, com seus caprichos, paixões e ciúmes, interagem intensamente com os humanos, tramando, confabulando, tomando partido  conforme seus interesses particulares e interferindo no andamento da guerra.

Vemos, por exemplo, que as três deusas que estão mais ligadas ao evento que motivou a guerra (o julgamento em que Páris elegeu Afrodite como a mais bela), elegem seus lados no conflito com base nesse evento. Hera e Atena, que normalmente são rivais (pelo fato de Zeus ter dado à luz Atena), se juntam contra o povo de Páris, enquanto Afrodite, em recompensa pelo privilégio obtido, e por ter como filho o guerreiro troiano Enéias,  protege Ílio. Afrodite  nutre especial afeição por Páris, e ao vê-lo ameaçado, o retira da luta, salvando-o da morte e devolvendo-o aos braços de Helena. Atena, filha de Zeus, sábia e estrategista, protege Diomedes fervorosamente como se nele habitasse e nele e seus espíritos se tornassem indistintos.  A ele, a divindade infunde todas as qualidades de um guerreiro, que vão além da força e da coragem. Os dois filhos de Zeus, Apolo, deus do sol e  Ares, o deus da guerra, de caráter imprevisível e ambíguo, tomam partido pelos troianos e Zeus, o rei dos deuses, soberano do Monte Olimpo e deus do céu e do trovão, atua em diferentes momentos a favor dos gregos ou troianos.

Zeus e Tétis, de Ingres, 1811
Homero, portanto, não ignora o politeísmo característico da mentalidade grega. Por isso, a presença dos deuses é marcante na narrativa. Entretanto, ela não é fundamental, tendo em vista o humanismo do aedo. Além disso, os deuses são dotados de características, valores e sentimentos semelhantes aos dos homens. 

Mas seu humanismo não se restringe apenas ao fato de o destino dos homens estarem em suas próprias mãos, mas também se faz presente quando a ação dos homens acaba por interferir  nas decisões dos deuses. Isto pode ser ilustrado pela atitude de Agamémnone, negando-se a atender aos rogos de Crises pela libertação da filha e provocando uma  reação de Apolo que imediatamente envia uma peste que se abate sobre os exércitos gregos. Esse fato culmina com a discórdia entre o Atrida e Aquiles e motiva a interferência de Zeus em favor dos troianos, a pedido de Tétis.

A Morte de Heitor, Franz Matsch, 1861-1943
O plano que prepondera, entretanto, é o dos homens, e podemos dizer que, de forma geral, a perspectiva de Homero quanto à relação entre deuses e humanos é humanista.  Pois é nos heróis mortais que encontramos a natureza humana exaltada, com os sentimentos, valores e virtudes que os caracterizam, num palco onde o amor, a coragem e a ternura andam juntos com o ódio, com a covardia; onde a soberba de alguns contrasta fortemente com a sobriedade de outros, e a piedade muitas vezes sobrepuja o desejo de vingança; onde a  amizade e o respeito falam mais alto que o medo; onde os feitos heroicos de poucos os levam ao mesmo patamar dos deuses. E sobretudo, fala de um valor maior, que é a honra dos homens, que, de tão significativa, está muito acima da vida, que de tão forte, supera inclusive os deuses.

Há um terceiro plano, secundário, mais estilístico do que narrativo, que é composto das várias metáforas de que Homero se vale para descrever momentos cruciais da história. Assim é que sempre recorre a imagens da natureza, especialmente de animais, que nos fazem visualizar, por exemplo, um enorme enxame de abelhas se juntando, ao mesmo tempo em que podemos ver a multidão de soldados se aproximando de Agamémnone. Dessa forma,  as metáforas são utilizadas para  nos ajudar a ter uma ideia mais precisa da natureza da cena descrita.

Príamo aos pés de Aquiles, Joseph Wencker, 1871
Como narrativa épica, a Ilíada é exemplar, no sentido de desenhar  com vastos detalhes os valores, costumes e cultura material dos gregos, especialmente aqueles relacionados à guerra: as relações de amizade e lealdade cultivadas pelos guerreiros se evidenciam quando algum deles morre, o que causa grande pesar no seu melhor amigo; há uma constante preocupação em resgatar os pertences dos que tombam em batalha, ao mesmo tempo em que se busca tomar dos cadáveres inimigos suas armaduras e suas armas, como troféus de guerra; a relação com a morte também é destacada com o cuidado em se resgatar os corpos dos companheiros e lhes proporcionar funeral adequado; as armaduras, armas e outros objetos são descritos com minúcia, caracterizando os diversos povos que participam do conflito.
Andrômaca vela o corpo de Heitor, Jacques-Louis David, 1877
As minuciosas descrições do resgate dos mortos e da posse das armas ao longo da narrativa evolui até o seu ápice, como se Homero fornecesse subsídios ao leitor para a compreensão de um final que culmina com o episódio da morte de Pátroclo e a posse da armadura de Aquiles por parte de Heitor. Uma atitude que, longe de configurar desrespeito, implica  em um reconhecimento das qualidades do guerreiro grego e o desejo de incorporá-las em si mesmo, fortalecendo seus próprios atributos.

A narrativa alcança seu ponto mais elevado quando o corpo do herói troiano é profanado por Aquiles e conduzido  até seu acampamento, como se a Homero fosse imprescindível o ato desumano para proporcionar o brilhante desfecho que mobiliza os  deuses e guerreiros de ambos os lados em torno da dor do ancião Príamo e da comovente súplica que toca o coração endurecido do guerreiro Aquiles e  permite o resgate do corpo para ser devidamente velado em Troia.


ILÍADA - HOMERO

Roteiro

1- Introdução 

O título

Ilíada advém de Ílion ou Ílio – nome pelo qual, na mais remota antiguidade, era designada a cidade de Tróia. Narra não toda a Guerra de Troia  mas os fatos ocorridos em curto período da fase final dos combates, no décimo e último ano do cerco.

Questão Homérica

Homero  teria nascido por volta de 850 a. C em um lugar da Jônia e muitas cidades disputavam entre si a honra de tê-lo como filho.
A ele são atribuídos – embora haja controvérsias que encobrem a composição deles e sua autoria - os dois maiores poemas épicos da Grécia antiga, que reconstituem, com riqueza de detalhes, a civilização grega: A Ilíada, que narra a Guerra de Troia e é associada a reflexões sobre a vida do homem e sua relação com os deuses e a Odisséia, que conta as aventuras do herói Odisseu, em sua volta para a ilha de Ítaca, depois de participar ativamente na guerra.

Segundo Aristóteles, Homero teria escrito a Ilíada na juventude e a Odisséia, no fim de sua vida, como complemento da primeira e ampliação da sua perspectiva.

As diferenças de tom e estilo entre as duas obras levaram alguns críticos a sugerir a hipótese de que poderiam ter sido criadas por autores diferentes. 

A Epopeia

A epopeia é um gênero narrativo em verso que visa celebrar feitos grandiosos de heróis fora do comum, reais, lendários ou mitológicos, tendo pois sempre um fundo histórico. Na narrativa, as descrições são minuciosas, revelando detalhes dos guerreiros, da paisagem, das vestimentas e das cenas de batalha.

Os personagens épicos não tem um desenvolvimento psicológico complexo, seguem seus traços básicos e não sofrem mudanças no desenrolar da história.

A Forma

O poema é constituído por 15.693 versos, divididos em 24 cantos. A métrica empregada é o hexâmetro dactílico, verso tradicional da épica grega, composto de seis sílabas poéticas, cujo ritmo é formado por uma sílaba longa e duas breves.

Enredo

 A Ilíada começa com a Guerra de Troia  já bem próximo do fim e com o herói Aquiles agastado em sua tenda, recusando-se a participar do cerco aos troianos. Tem início in medias res (no meio dos fatos), e avança dali para o fim, com o passado se revelando sem pressa e muitas vezes confusamente, por meio de flashbacks ou diálogos reconstitutivos. 

2) Resumo da narrativa:

A Guerra de Troia foi um conflito que se iniciou quando o príncipe troiano Páris raptou Helena esposa do rei de Esparta, Menelau. Agamémnone, irmão de Menelau, arma os exércitos gregos e os leva através do mar Egeu para sitiar Tróia.

No décimo ano do cerco a Troia  durante uma divisão de espólios de guerra, há um desentendimento entre Agamémnone e Aquiles, por causa da cativa Briseide. Aquiles sentindo-se ferido em seu orgulho, retirou-se do combate, junto com seus soldados, os Mirmídones, e pede ajuda aos deuses para se vingar de Agamémnone. Em resposta, Zeus toma partido por Troia. Ferozes batalhas são travadas, onde se confrontam vários guerreiros,entre eles Páris e Menelau, Heitor e Ajaz.
Os gregos começaram a fracassar em suas investidas e estavam ameaçados de ser liquidados pelos troianos, quando Aquiles, movido pela necessidade de vingar a morte de Pátroclo, retornou à peleja. Entrou em combate e matou Heitor, assassino de seu grande amigo, amarrando o corpo a seu carro e arrastando-o ao redor das muralhas da cidade. Em seguida promove o funeral de Pátroclo. Príamo roga o corpo do filho e Heitor é devidamente velado em Troia.

3) Personagens principais:

Gregos

Aquiles: filho da deusa Tétis e do rei Peleu. O melhor guerreiro de todos e líder dos mirmídones;
Menelau: rei de Esparta, marido de Helena e irmão de Agamémnone
Agamémnone: rei de Micenas e comandante 
Pátroclo: Filho de Menécio e primo e melhor amigo de Aquiles. Foi morto por Heitor. 
Odisseu: rei de Ítaca, considerado muito astuto, é o principal personagem da Odisséia;
Calcante: vidente que guia os aqueus;
Diomedes: filho de Tideu e príncipe de Argos, participou ativamente do cerco à Troia
Nestor: rei de Pilo, pai de Antíloco, tem o papel de sábio ancião que dá conselho aos jovens e bravos soldados; 
Ajaz: rei de Salamina, filho de Telamon, grande e poderoso; e
Ajaz (2): rei dos Lócrios, filho de Oileu, agíl e veloz;
Teucro: Guerreiro de Salamina, irmão de Ajaz Telamônio.

Troianos

Páris: príncipe de Troia, que em viagem à Esparta, rapta Helena, esposa de Menelau;
Helena: Esposa de Agamémnone e depois de Páris. (Aqui entre os troianos, pois é na cidade de Troia sua maior participação na narrativa).
Heitor: Príncipe de Troia e irmão de Páris, muito valoroso e o maior guerreiro troiano;
Príamo: rei de Troia, pai de Heitor e Páris;
Enéias: primo de Heitor e Páris é o personagem principal da Eneida
Andrômaca: esposa de Heitor
 Hécuba: esposa de Príamo.
Sarpédone: Guerreiro lício, filho de Zeus;
Cassandra: Filha de Príamo, profetiza.

 Aquiles

O filho de Tétis e Peleu é o guerreiro Aquiles, e sua mãe, objetivando fortalecê-lo em sua natureza humana o mergulhou quando ele ainda era bebê nas águas do mitológico rio Estige, tornando-o invulnerável, exceto no calcanhar, ponto por onde foi segurado.

Noutra versão, Tétis unge o filho com ambrosia e o põe no fogo para queimar as partes mortais do corpo. Peleu a interrompe e substituiu o calcanhar carbonizado do filho pelo do gigante Dámiso, célebre por sua velocidade na corrida. Por isso, Aquiles era chamado de “O dos pés ligeiros”.

Aquiles se torna o mais poderoso dos guerreiros, porém, ainda é mortal! Mais tarde, sua mãe profetiza que ele poderá escolher entre dois destinos: morrer jovem lutando em Troia e alcançar a glória eterna, ou permanecer em sua terra natal e ter uma longa vida, porém sem nenhuma glória e ser rapidamente esquecido. Seus feitos na guerra de Troia  evidenciam o destino escolhido pelo herói.

Páris

Pouco antes do nascimento de Páris, sua mãe, Hécuba, sonhou que dava à luz um archote que depois queimou toda a cidade. Um adivinho predisse que seu filho causaria a ruína de Troia  o que foi suficiente para convencer Príamo, o pai, a abandoná-lo nos altos do monte Ida. Mas um pastor o levou consigo e o criou como filho. Posteriormente, ao vencer jogos atléticos disputados na cidade de Troia, foi reconhecido pela irmã Cassandra, que tinha dons proféticos, e aceito de volta por Príamo e Hécuba. 

Mais tarde, Páris foi escolhido por Zeus para o julgamento do pomo da Discórdia: uma maçã de ouro que a deusa Éris, enciumada por não haver sido convidada, jogara no meio do salão em que se celebravam as bodas de Tétis e Peleu, e na qual estava escrito: "À mais bela". Assim, Hermes conduziu as três deusas ao Monte Ida, onde Páris pastoreava rebanhos e este escolheu Afrodite, que em troca lhe prometeu a mulher mais formosa do mundo. Esta, era Helena, casada com Menelau, rei de Esparta. Sua decisão fez Hera e Atena se tornarem inimigas ferozes de Tróia.

Algum tempo depois do julgamento, Páris dirigiu-se a Esparta, onde foi recebido pelo rei Menelau. Mas este teve de viajar até Creta e durante sua ausência, protegido por Afrodite, Páris seduziu Helena e raptou-a. Tais acontecimentos trouxeram como consequência a Guerra que selaria o destino de Tróia e de seus heróis. 

4) Participação dos deuses:

Os deuses têm importante participação em todos os episódios do poema e interagem freqüentemente com os personagens humanos; lutam em várias batalhas, alguns chegando a ser feridos.
Do lado dos gregos, estavam, Tétis (Ninfa do mar, mãe de Aquiles), Atena (deusa da guerra e da sabedoria), Hefesto (deus do fogo e dos metais), Hera (esposa e irmã de Zeus, deusa da família) e Posido (deus do mar).

Do lado dos troianos, estavam: Afrodite (deusa do amor e da beleza), Ártemis (irmã gêmea de Apolo, deusa da caça e da serena luz), Apolo (filho de Zeus, deus do sol e da música), Ares (deus da guerra) e Zeus (rei dos deuses, deus do céu e do trovão, que atuou em diferentes momentos, a favor dos gregos ou dos troianos.

5) Cantos 

A Ilíada é composta de 24 cantos. Acredita-se que o poema tenha origem na tradição oral, cantada pelo rapsodo. Existem diversas seções que se repetem, como recurso que facilitariam a memorização, indicando sua natureza de obra transmitida oralmente.

Resumo do Canto I
No canto I,  que trata de um dos momentos da ira  de Aquiles, o narrador inicia o poema pedindo inspiração à musa para cantar a causa de haver a peste se abatido sobre os guerreiros gregos que sitiavam Tróia e de Aquiles haver se encolerizado. Em seguida remonta alguns acontecimentos que explicariam os dois fatos, lembrando que Crises, sacerdote de Apolo, trazendo grande recompensa, suplicara a Agamémnone que lhe devolvesse a filha Criseide tomada como espólio de guerra depois de um assalto a tebas. Sendo o pedido ignorado, Crises, contrariado ora a Apolo para que castigue os aqueus. Apolo salta do Olimpo e vem às praias de Tróia, dizimando os gregos e seus animais, com suas setas incandescentes. 

Aquiles, inspirado por Hera, propõe consultar um intérprete de sonhos para desvendar o mistério da peste. Calcante,  revela que Apolo está furioso por causa do ultraje a seu sacerdote Crises e que a situação só poderá ser revertida mediante a restituição de Criseide.

Agamémnone  concorda que devolver Criseide a seu pai é mais vantajoso para os gregos e ordena então que algum dos chefes a leve numa nau, junto com o sacrifício, para aplacar a ira de Apolo. Porém, o Atrida exige uma  restituição justa e imediata de sua escrava por outra .

Aquiles responde que o rei se contenha em sua avareza  e aguarde os espólios de Tróia. Argumenta que sua participação na guerra é injustificada, pois não há contenda entre ele e os Troianos, estando ali apenas por ordem de Agamémnone; alega que o Atrida sempre fica com o quinhão mais valioso nas pilhagens, enquanto que os demais recebem pagas mesquinhas. Decide, enfim, que, por se sentir desonrado, retornará a Ftia, sua terra-natal.

O Atrida concorda que Aquiles se vá, mas lhe avisa que mandará tomar sua escrava, Briseide, em recompensa pela perda de Criseide.

Contrariado, Aquiles tem ímpetos de puxar a espada e atacar Agamémnone, mas é detido por Atena, que  segurando-o pela cabeleira, pede-lhe que controle a cólera. Nestor também intervém, aconselhando que ambos se comportem dignamente, lembrando que a contenda poderá levar vantagem aos Troianos.

O Atrida Agamémnone então envia dois arautos para buscar Briseide na tenda de Aquiles e a escrava é entregue por Pátroclo. Aquiles vai para perto do mar, chorando, a clamar por sua mãe. Tétis promete implorar a intercessão de  Zeus em favor dos  Troianos, como forma de castigar Agamémnone.  Enquanto isso, Odisseu chega até Crises e lhe devolve a filha.  Após sacrifício, o sacerdote, pede ao deus Apolo que cesse os castigos contra os Aquivos. Os Acaios dormem na nau e pela manhã retornam à Tróia.

Tétis vai até Zeus implorar o favor que Aquiles lhe pedira. Hesitando, por saber que intervir na guerra traria a ira de Hera, Zeus concorda em ajudar  Tétis. 

Resumo dos demais Cantos

Canto II - O sonho e a convocação dos exércitos: Zeus, em sonho, ordena que Agamémnone arme os exércitos. Ele pretende retornar à pátria, mas Odisseu convence os gregos a ficar e lutar.

Canto III - Duelo de Menelau e Páris: Páris propõe um duelo para decidir o destino da guerra  e do qual Helena será prêmio. Menelau vence, e quando Páris ia sucumbir é  levado por Afrodite aos braços de Helena.

Canto IV – Reiniciam-se os combates: Atena aparece ao guerreiro Pândaro e o faz atirar uma flecha contra Menelau, violando assim o pacto e a guerra recomeça.

Canto V - Proezas de Diomedes e participação dos deuses: Atena  instiga Diomedes combate. Pândaro é morto e Enéias é ferido. Diomedes fere  Afrodite e Ares.

Canto VI - Outras proezas de Diomedes: Diomedes não recua e mata mais troianos. Heitor, seguindo o conselho de Heleno, faz oferendas a Atena, e retorna para a  batalha junto com Páris.

Canto VII - Duelo de Heitor e Ajaz: Heitor duela com Ajaz Telemônio. A luta é  interrompida pela noite, com empate.

Canto VIII -  Os deuses e o combate: Zeus proíbe a intervenção dos deuses no combate. Hera e Atena tentam intervir em favor dos aqueus.

Canto IX -  Desânimo dos aqueus e recusa de Aquiles: Os aqueus se desanimam e são instigados por Diomedes e Nestor. Agamémnone tenta se reconciliar com Aquiles, mas este se  recusa.

Canto X -  A espionagem: Diomedes e Odisseu, em missão de espionagem, matam Dólon, espião troiano e atacam o acampamento  dos Trácios, aliados dos troianos.

Canto XI - Proezas de Agamémnone: Agamémnone comanda os aqueus e vence a batalha. Zeus salva Heitor e Agamémnone é ferido. Diomedes também é ferido, e Ajaz põe o exército troiano em fuga. Pátroclo, informado da situação  dos aqueus, pede ajuda a Aquiles, mas este  se nega a ajudar.

Canto XII - Façanhas de Heitor: Heitor supera a muralha dos aqueus com uma grande pedra  e estes fogem até as naus.

Canto XIII - Combate junto às naus: Há muitas baixas entre os gregos, e Posido se apieda do gregos o os motiva. Os dois Ajaz avançam o exército  aqueu.

Canto XIV - Hera engana Zeus: Hera faz com que Zeus adormeça, permitindo a reação grega e Ajaz  fere Heitor.

Canto XV -  Os gregos fogem: Zeus acorda e impede que Posido continue interferindo. Os troianos avançam e são rechaçados por Ajaz.

Canto XVI - Ajuda de Pátroclo: Pátroclo pede a armadura, as armas de Aquiles e permissão para entrar na luta e combate fingindo ser  o amigo, mas é morto por Heitor.

Canto XVII - Disputa pelo corpo de Pátroclo: Menelau e Ajaz  protegem o corpo de Pátroclo. Ajax fica com o corpo e Heitor, com a armadura  de Aquiles.

Canto XVIII  - Novas armas:  Aquiles, ao saber da morte de Pátroclo, fica abatido e pede   a sua mãe Tétis que providencie novas armas.

Canto XIX - A volta de Aquiles:  Aquiles, de armadura e armas novas, se reconcilia com Agamenon e retorna ao combate desejando vingança e com muita fúria.

Canto XX - Guerra dos deuses: Batalha furiosa, onde os deuses participam livremente. Hera, Hermes, Atena, Posido e Hefesto lutam ao lado dos gregos e Ares, Ártemis, Apolo e Afrodite, ao lado dos troianos.

Canto XXI - Combate no rio: Os troianos  são derrotados à margem do rio Xanto. Apolo afasta  Aquiles dos muros de Tróia  utilizando um  disfarce.

Canto XXII - Morte de Heitor: Aquiles e Heitor lutam e Aquiles mata Heitor, desonrando seu corpo ao arrastá-lo pelo acampamento.

Canto XXIII - Jogos fúnebres para Pátroclo: Aquiles promove os funerais de Pátroclo.

Canto XXIV – O corpo de Heitor é resgatado: Príamo  implora a Aquiles o corpo do filho. Aquiles fica comovido e são concedidos 10 dias de trégua para a preparação do  funeral de Heitor.

 REFERÊNCIAS 

HOMERO. Ilíada. Trad. Carlos Alberto Nunes. 7 ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 2001.
CALVINO,  Italo. Por que ler os clássicos. 1ª ed. São Paulo. Companhia das letras, 1993. 
BONNARD, André.  A Civilização Grega. Trad. José Saramago. Lisboa: Edições 70, 2007.
HOMERO. Ilíada. Trad. Manuel Odorico Mendes. 2 ed. São Paulo: Martin Claret, 2009.

Sites visitados:
http://www.consciencia.org/iliada-homero-resumo
http://www.usp.br/revistausp/01/10-medina.pdf 
http://www.consciencia.org/iliada-homero-resumo 
http://pt.shvoong.com/humanities/history/1691091-principe-p%C3%A1ris-troia/ 
http://www.algosobre.com.br/mitologia/aquiles.html 
http://educacao.uol.com.br/biografias/ult1789u388.jhtm 



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3 comentários:

Jens disse...

Clap! Clap! Clap!
Análise de fôlego, reveladora, muito bem estruturada num texto cristalino, distante do vocabulário muitas vezes empolado e incompreensível da Academia. Dá prazer de ler. Ouso dizer que é especialmente recomendado para as novas gerações que desconhecem os clássicos. Vou indicar para a Mari Timm, a minha Rainha Preta.
Parabéns, Inês.

Ines Mota disse...

Obrigada, Jens!!
Beijão.

Jota Effe Esse disse...

Ler a Ilíada, uma avetura e tanto. No meu caso foi a Bíblia, várias vezes tentei ler e desistia. Só depois da idade madura consegui chegar lá, e diria dela o que dizes da Ilíade. Meu beijo.