quinta-feira, 25 de junho de 2009

"O labirinto", por Jorge Luis Borges

(imagem da internet)

Este é o labirinto de Creta.
Este é o labirinto de Creta cujo centro foi o Minotauro.
Este é o labirinto de Creta cujo centro foi o Minotauro que Dante imaginou como um touro com cabeça de homem e em cuja rede de pedra se perderam tantas gerações.
Este é o labirinto de Creta cujo centro foi o Minotauro, que Dante imaginou como um touro com cabeça de homem e em cuja rede de pedra se perderam tantas gerações como Maria Kodama e eu nos perdemos.
Este é o labirinto de Creta cujo centro foi o Minotauro, que Dante imaginou como um touro com cabeça de homem e em cuja rede de pedra se perderam tantas gerações como Maria Kodama e eu nos perdemos naquela manhã e continuamos perdidos no tempo, esse outro labirinto.


(in Atlas - tradução de Miguel Angel Paladino)






De como um ícone, um mito que revolucionou a música pop, não conseguiu escapar dos traumas de infância, das doenças (reais ou fictícias) das tragédias, dos desencontros, dos desajustes, da solidão.
E morre só ...

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segunda-feira, 22 de junho de 2009

Kafka em 4 minicontos.

(Kafka. Esboço de um raro sorriso...longe da opressão?)

Lamentos
São as sedutoras vozes da noite: também assim cantavam as Sereias...
Não fora de justiça, para com elas, atribuir-lhes o deliberado propósito de seduzir: elas bem sabiam que possuíam garras e nenhum seio fértil, e disso lamentavam-se em altas vozes - mas não tinham culpa de soarem tão belos os lamentos.

A Coleira
Livre e confiante cidadão da Terra, eis que está preso a uma corrente longa o bastante para lhe proporcionar a liberdade sobre todo o espaço terrestre; conquanto longa apenas de maneira a que não o solicite coisa alguma fora dos limites da Terra. É ao mesmo tempo livre e confiante cidadão do Céu, e eis que está preso a igual corrente celeste.
Quando pende muito para a Terra, estrangula-o a corrente celeste; quando pende muito para o Céu, estrangula-o a coleira terrestre...
Tem todavia todos os recursos, sente isso; sim, mas obstina-se em negar que tudo se dava a um erro inicial na fixação dos grilhões.

O pião
Um filósofo costumava circular onde brincavam crianças. E se via um menino que tinha um pião já ficava à espreita. Mal o pião começava a rodar, o filósofo o perseguia com a intenção de agarrá-lo. Não o preocupava que as crianças fizessem o maior barulho e tentassem impedi-lo de entrar na brincadeira; se ele pegava o pião enquanto este ainda irava, ficava feliz, mas só por um instante, depois atirava-o ao chão e ia embora. Na verdade, acreditava que o conhecimento de qualquer insignificância, por exemplo, o de um pião que girava, era suficiente ao conhecimento do geral. Por isso não se ocupava dos grandes problemas – era algo que lhe parecia antieconômico. Se a menor de todas as ninharias fosse realmente conhecida, então tudo estava conhecido; sendo assim só se ocupava do pião rodando. E sempre que se realizavam preparativos para fazer o pião girar, ele tinha esperança de que agora ia conseguir; e se o pião girava, a esperança se transformava em certeza enquanto corria até perder o fôlego atrás dele. Mas quando depois retinha na mão o estúpido pedaço de madeira, ele se sentia mal e a gritaria das crianças – que ele até então não havia escutado e agora de repente penetrava nos seus ouvidos – fugentava- o dali e ele cambaleava como um pião lançado com um golpe sem jeito da fieira.

O abutre
Era um abutre que me dava grandes bicadas nos pés. Tinha já dilacerado sapatos e meias e penetrava-me a carne. De vez em quando, inquieto, esvoaçava à minha volta e depois regressava à faina. Passava por ali um senhor que observou a cena por momentos e me perguntou depois como eu podia suportar o abutre.
- É que estou sem defesa - respondi. - Ele veio e atacou-me. Claro que tentei lutar, estrangulá-lo mesmo, mas é muito forte, um bicho destes! Ia até saltar-me à cara, por isso preferi sacrificar os pés. Como vê, estão quase despedaçados.
- Mas deixar-se torturar dessa maneira! - disse o senhor. - Basta um tiro e pronto!
- Acha que sim? - disse eu. - Quer o senhor disparar o tiro?
- Certamente - disse o senhor. - É só ir a casa buscar a espingarda. Consegue aguentar meia hora?
- Não sei lhe dizer. - respondi.
Mas sentindo uma dor pavorosa, acrescentei:
- De qualquer modo, vá, peço-lhe.
- Bem - disse o senhor. - Vou o mais depressa possível.
O abutre escutara tranquilamente a conversa, fitando-nos alternadamente. Vi então que ele percebera tudo. Elevou-se com um bater de asas e depois, empinando-se para tomar impulso, como um lançador de dardo, enfiou-me o bico pela boca até ao mais profundo do meu ser. Ao cair senti, com que alívio, que o abutre se engolfava impiedosamente nos abismos infinitos do meu sangue.




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sexta-feira, 19 de junho de 2009

Cuando éramos niños - Mario Benedetti

(Foto: Inês Mota)

Cuando éramos niños
los viejos tenían como treinta
un charco era un océano
la muerte lisa y llana
no existía.

luego cuando muchachos
los viejos eran gente de cuarenta
un estanque era un océano
la muerte solamente
una palabra

ya cuando nos casamos
los ancianos estaban en los cincuenta
un lago era un océano
la muerte era la muerte
de los otros.

ahora veteranos
ya le dimos alcance a la verdad
el océano es por fin el océano
pero la muerte empieza a ser
la nuestra.

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segunda-feira, 8 de junho de 2009

Off. Diário de bordo 1

Meus queridos leitores: Gostaria de ratificar a minha mais completa inaptidão para escrever um artigo legal. E por isso, não posto nada, ainda. Ou seja, estou aqui para dizer que não estou.
Ai, ai...
Pois não é que descobri, entre surpresa, decepcionada e resignada, que não tenho leitores?
Pra você ver as criaturas como são. Eu aqui, tão enferma, coitadinha e nenhum vivente se dirigiu a minha pessoa para desejar boa recuperação. Nem um chazinho de hortelã, nem um mísero Apracur, um Anador ou um Vick Pirena.

Estou mal e com uma aparência horrível. Os olhos lacrimejam e as articulações doem a nível quase insuportável. Minha cabeça pesa uma tonelada e um aguaceiro constante escorre pelo nariz, além dos irritantes acessos de tose, do frio e das lombras da febre.

Hoje, após dois dias sem me alimentar, minha filha trouxe-me um prato de comida e gentilmente ordenou: En-gu-la!!!!!
E eu engoli. Fazer o que? Ainda que meu paladar não reconhecesse o sabor de uma cenoura e o meu olfato ignorasse o cheiro do peixe. Desceu tudo feito bucha. Segundos depois, representantes de uma pequena rebelião interna ameaçavam retornar ao lugar de origem. Ficou só na ameaça, felizmente, ainda que eu me sentisse inflada feito uma bóia. Agora sei exatamente como se sentem os pobres gansos destinados a produzir foe gras. (Ainda fazem aquilo com os bichinhos?)
Em suma, é isso.
Estou destruída. Debilitada. Logo hoje que ia começar uma série na academia pra turbinar quadríceps, glúteos, bíceps, tríceps e adjacências?...
Odeio gripe!
Mãeeê!... buá.






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domingo, 7 de junho de 2009

Off.

(Imagem: não sei a autoria)

Olá, meus queridos leitores.
Estou enferma.
Não digo que estou gripada. O termo, parece que é obsoleto.
Tenho uma virose, então. ( E gripe não é uma virose?)
Mas deixa pra lá...

Pelo menos espero não ser a gripe suína. Ops, suína também não é apropriado.É Gripe "A" .

Mas voltemos ao motivo de minha incursão a esse Objeto:
Ficarei uns dias sem postar.
E vocês hão de perguntar: E daí?
Daí, nada...!
É isso!
Até porque ando severamente infectada e afetada por outro agente não microscópico - a falta de criatividade.
Prometo voltar quando sarar dos males físicos e puder postar algo decente.
Bye.
Beijos.
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sexta-feira, 5 de junho de 2009

Caicó não tem foie gras

A nova revista de bordo das linhas aéreas TAM está circulando o mundo todo dando um excelente destaque para a cidade de Caicó através de artigo publicado pela chef Ana Luiza Trajano que esteve recentemente na cidade. Ela inicia o artigo dizendo que “A pequena Caicó, no Rio Grande do Norte, é um paraíso Goumert a ser descoberto”.

Eis o artigo:

"Os franceses têm o vinho de Bordeaux, o sal de Guérande, a Poulett de bresse, o foie grás (sic) do Périgord, o presunto de Bayonne a Pimenta de Espelette… Tantos produtos identificados como selo de qualidade de sua appellation d’origine contrôllé! A Itália também valoriza o DNA de sua comida; o queijo de Parma, a mostarda Cremona, o tomate de San Marzano, a mussarela napolitana. Nós aqui no Brasil temos as nossas excelências regionais, nem sempre, porém, reconhecidas, e eu gostaria de começar por Caicó."

Caicó? Vocês hão de perguntar. É Caicó, no Rio Grande do Norte. Eu também não sabia. Foi numa visita a São Luiz do Maranhão que conheci o chef Dantas. Faz tempo que ele e a família são radicados no Maranhão. Mas me falaram com tanto orgulho da culinária de Caicó que fiz as malas e na companhia de Dantas, fui conhecer sua terra natal.

Hospedada por dona Neném, saí para explorar as preciosidades locais. Queijo de coalho, sequilhos, biscoitinhos de queijo, o biscoitinho palito, a raiva (mais um tipo de biscoitinho de lá). Produtos feitos com carinho artesanal – uma delícia. Com a grife Caicó. Reconhecida em todo o Nordeste.

Qualidade com hospitalidade.
Caicó se esmera para agradar os que têm água na boca. Almoçamos e jantamos na casa de cozinheiros e cozinheiras de primeira linha. Uma festa fora o apetite.

A Alessandra preparou um banquete de receitas regionais: arroz-de-leite, munguzá, farofa d’água, paçoca de carne de sol, carne-de-sol-assada, umbuzada, filhós de mel e suco de cajarana. Já o chef Sandro, do restaurante Brilhante, enveredou por especialidades autorais. Trouxe à mesa um “caviar de caju”, um “caju metido a besta” e um rondelli de macaxeira com carne de sol.

O Brasil é um lauto cardápio de Caicós pedindo para serem descobertos. Cada um com sua especialidade artesanal e sua história afetiva. Sempre deixando no paladar do viajante o gostinho do quero mais e a vontade de voltar algum dia. A Caicó eu sonho voltar agora em julho, para a Festa de Santana. Eles já adoram uma festa e a de Santana é a mais animada. Dizem na cidade que Caicó é muita festa, pouca água e muita festa. Eu meto a minha colher: e muita comida boa."

Por: Ana Luiza Trajano - Chef do restaurante Brasil a Gosto, de São Paulo, um dos melhores de gastronomia brasileira. Já publicou um livro com o mesmo nome, que tem poesias e fotografias inspiradas por suas viagens pelo país. É consultora do novo cardápio da TAM, o Brasil a Bordo.


Imagens: "Casa da Cultura de Caicó"- Blog de Anna Joelma, "À Flor da Pele"
Fonte: Blog do Robson Pires.
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